Eu era criança, mas já sabia como um homem devia ser - por causa dele. Esse meu primo nunca entrava despercebido em lugar nenhum: era alto, bonito, de riso fácil, super simpático. Todas as mulheres da família tinham aquela alegria de ser da família dele - sabe como é, ser tratada com carinho por alguém tão bacana não é prá qualquer uma... Pior que era! Ele tratava todo mundo bem - não tinha ninguém mais legal! Parecia que o sol tava sempre brilhando prá ele...
Não me entendam mal - não era aquele tipo de coisa de priminha apaixonada pelo primão: ele só era muito bom mesmo; a irmã, nem tanto: era aquela sobre quem contei esta história AQUI.
Bom, ele decidiu não fazer faculdade. Se embrenhou na vida artística, acabou fazendo catálogo de roupas, desfiles, posava em calças e camisas de grife, no tempo em que essa coisa de modelo não era esse turbilhão todo de fama que é hoje. Foi até trabalhar na televisão - chegou a apresentar uns programas na Rede Cultura, mas, com o tempo, preferiu trabalhar nos bastidores (onde continua até hoje - não, nessa historinha não tem morte, graças a Deus!).
Ele tinha uma namorada à altura - mais que à altura. Ela era uma beleza de primeira grandeza, daquelas somente vistas nos filmes, descritas nos livros - alguém que realmente lançaria mil navios ao mar, tal qual Helena de Tróia. Tinha a pele mais branca e imaculada que eu já vi, perfeita, sem uma pinta ou espinha (como é que ela conseguia isso, caramba?!), os olhos eram azuis brilhantes, como dois faróis... Os cabelos longos, negros, lindos... Tudo o que eu pensava era: Como é que Deus fez isso com o resto da humanidade???
Bom, eram realmente o casal perfeito, de encomenda.
Obviamente se casaram - e foi fácil, meu tio era rico, deu uma casa prá eles morarem, ali, bem perto da minha. Minha mãe fez cortinas da casa toda de presente de casamento (o vestido a noiva quis mandar fazer em loja chique - e ficou muito inferior ao que minha mãe teria feito, modéstia à parte, mas a mãe da noiva jamais se sujeitaria a entrar na casa de uma costureira tão pobrezinha como minha mãe...). A noiva, na verdade, de linda só tinha a estampa: olhava torto prá todo mundo, só era sorrisos prá quem interessava. Eu sacava ela de longe - metida só porque era maravilhosa de linda, um nojo...
No casamento deles comi prá caramba- sanduiche de carne louca, brigadeiro... Naquele tempo eles faziam uns espetinhos de frios no xuxu (alguém lembra?): no palito de dente espetava um pedaço de queijo, um de salsicha, pimentão, batatinha cozida e fincava o palito num xuxu (eu a-do-ra-va).
Eu tinha 9 anos de idade, minha mãe me fez um vestido amarelo de laise, muito lindo, que eu sujei de refrigerante...
Voltaram da Lua de Mel e começaram a vida de casados: ele ainda trabalhando como modelo de calças e camisas, ela professorinha primária (que era status naquela época, não é como hoje que ser professor é uma missão pros corajosos...).
24 camisas. Esse era o enxoval pessoal dele. 24 camisas ele trouxe quando se casou com ela. Cada dia ele usava uma, deixava pendurada no banheiro quando chegava à noite e ia tomar banho, vestia roupa de casa. Dia seguinte, pegava outra no guarda roupa.
Um belo dia, 24 dias depois de estarem morando juntos, para ser mais precisa, não tinha mais camisas no armário. Ele perguntou prá ela onde estavam e ela disse que estavam todas num cesto, na área de serviço. Ele perguntou por quê ela não tinha lavado e ela respondeu que não tinha obrigação de lavar. Que as roupas dela ela levava prá empregada da mãe dela lavar. "Então porquê não levou as minhas também?" ele perguntou... Ao que ela respondeu "que não seria justo com a empregada, pois ela era paga prá lavar somente as roupas da família dela"...
Ela disse que sempre fora criada sem fazer nada, que ele já sabia disso quando a conheceu, que não devia ter pedido ela em casamento se não tinha cacife prá pagar os luxos aos quais ela estava acostumada.
Aí o véu do encanto de recém casado caiu dos olhos dele: ela vinha fazendo absolutamente nada em casa! Quem vinha limpando uma loucinha aqui, estendendo um lençol ali era a irmã mais velha dele, que morava do lado e vinha dar uma checada na casa (acho que queria que tudo desse certo...). Mas não lavou nenhuma camisa, pois nem tocou na área de serviço, que estava sempre arrumadinha (lógico, ninguém sequer chegava perto dela!).
Bom, ele até podia ter se socorrido do próprio pai, pedir prá contratar uma faxineira, uma diarista de vez em quando. Mas acho que caiu a ficha. Eles se separaram, sem chance de volta. Ela até que ficou tentando voltar prá ele, ainda mais quando soube que estava grávida. Mas ele não quis (turrudo - tem muito disso na minha família...).
Esse caso é famoso entre nós - é quase "O conto das 24 camisas" ou "O Casamento Relâmpago".
Ela nunca mais se casou - católica fervorosa, jamais cometeria esse pecado.
Ele se arranjou com uma mulher dez anos mais velha, já com um filho de um casamento anterior, montada na grana - mas do tipo que veio de baixo e não tem preguiça nem tempo ruim, faz comida, lava e passa camisa se a empregada tá ocupada com outra coisa. Muito felizes até hoje.
Daí tirei uma lição: casamento não é conto de fadas. É vida real, é comida prá fazer, roupa prá lavar, é abrir concessões, até fazer sacrifícios.
Quando eu trabalhava fora, uma vez uma colega me chamou de trouxa e de Amélia porque eu engraxava os sapatos do "Marildo". Ora, eu não via nenhum mal nisso! Eu trabalhava meio período, ele período integral - e não ia cair minha mão em ajudar, ia? Casamento é companheirismo, irmandade - não é só criar juntos os filhos, dividir as contas, dormir na mesma cama.
Por isso, se alguém pensa que meu casamento é perfeito - se engana. Meu casamento é uma batalha cruel, uma demolição e uma reconstrução diária, um projeto em andamento. Por sorte a gente se ama, se aceita, se perdoa. E vai se modificando no trajeto, se adequando prá não ir cada um prá um lado porque, afinal de contas, nós dois odiaríamos ficar longe um do outro e perfeito - só é Deus.
Bom ouvir isso..em tempos que da vontade de passar com um trator em cima de algumas pessoas....kkkk....paciência....paciência.
ResponderExcluirPrá conviver com o ser humano paciência é fundamental, não é mesmo? Acontece com todo mundo, de vez em quando - mas se a gente desiste de fazer dar certo, depois se arrepende... Beijos
ExcluirRosa,
ResponderExcluiramei ler esta história...
Fantástica!!!
A vida é mais terra a terra, pés no chão....
essa moça era mimada ao extremo e
isso acabou com a sua vida...
abraços de Maria Filomena
Disse tudo, Filomena querida - pés no chão. A gente tem que crescer e encarar a vida com coragem, qualquer que seja o desafio. Beijos!
Excluireh d rosa a vida é assim mesmo as vezes o que parece que vai dar certo dá errado e vice - versa. namorei apenas 6 meses e estou casada como já disse a 14 anos, passamos por momentos lindos mas também enfrentamos dificuldades, e é sempre bom ouvir as pessoas mais experientes como a senhora, afinal como disse chico anysio, quem segue o conselho dos pais não se dá mal na vida... bjs.
ResponderExcluirAté o clima muda, não é mesmo? Tem dia que o céu tá azul, tem passarinho voando no céu... Dias frios, dias de chuva, tempestades - e a gente enfrenta todos, sobrevive. Nos relacionamentos também os dias não são todos iguais - a cada dia temos que ter um cuidado especial. Beijos e parabéns pelos 14 anos de felicidade batalhada.
ExcluirÉ Rosa, casamento é regar todo dia, por pra tomar sol, tirar pra não secar de vez! Somos humanos, e se não houver uma tolerância mútua e contínua, aí vai pro brejo mesmo! Quando um é fogo, o outro é água e assim um equilíbrio. Assim se sustenta um relacionamento, e quanto mais os anos vão passando, vamos olhando pro outro e amando cada defeitinho chato e percebemos que isso é amor! bjs
ResponderExcluirNina
Isso mesmo! Tudo o que a gente batalha prá conseguir tem que continuar ininterruptamente batalhando prá manter - sadio, equilibrado, feliz. É um dia após o outro, todos eles trabalhados pelo melhor. Beijos!
ExcluirÉ isso mesmo, pros outros tudo pode parecer fácil, perfeito, mas nós sabemos o cuidado que tem que se ter pra um casamento durar tanto e principalmente, valer á pena!! Mas pessoas como você e seu marido servem de exemplo não só de uma bela união, mas também como pais, e pelo amor ao próximo e aos animais.
ResponderExcluirbeijos
Só quem está dentro é que sabe as lutas que enfrenta - e quem desiste, no final, não tem nada nas mãos prá apresentar. As conquistas tem que ser batalhadas, até prá gente dar valor a elas. Beijos, Luci querida!
ExcluirRosinha, fizeste mais pelos casamentos tremidos que por aí pululam que 1000 tratados de como bem casar.
ResponderExcluirCasamento é dose.
Casamento só sobrevive se nele se investe. Muito!
Eu tenho um bom casamento, cheio de acessos de fúria, de arrependimento, de carinho, de encontro e desencontro.
Tenho um bom casamento.
Beijo
Imagino que seja um excelente casamento mesmo, Nina querida! Com todo teu poder de argumentação acredito que nenhum problema fique sem ser resolvido. Parabéns! Beijos.
ExcluirTodos que olham casamentos bem sucedidos não veem tudo que foi feito, chorado, esperneado e doado para que funcionasse. O que me chamou a atenção na história foi o fato dela não considerá-lo como família. Querer lavar ou não era opção dela mas daí a criar a separação logo de cara foi demais. Ela mostrou a que veio e ele viu o futuro bem a sua frente. Se ele precisasse de um remédio qd gripado ou coisa parecida, é bem provável que ela saísse fora. Casamento é uma construção e processo mesmo. Todos os dias e principalmente nas crises: perdão mútuo!!!
ResponderExcluirbjssss Rosa
É como os padres dizem na hora de casarem as pessoas: na saúde, na doença... Quem se casa achando que só vai ter momentos bons se casa enganado. As pessoas deviam ter consciência de que, ao se casarem, arrumam um companheiro prá ajudar a enfrentar também as tempestades da vida, não apenas prá aproveitar os dias de sol. Aqueles que percebem isso são os que tem os casamentos que dão certo. Beijos e obrigada pelo comentário.
ExcluirRosinha querida ,é isso mesmo ,casamento tem que ser
ResponderExcluirfeito de dois bons perdoadores ,o meu é ótimo ,meu marido
é muito doce ,quase nunca nos zangamos é verdade mesmo ,
nós falamos e chegamos sempre a acordo ,gosto do meu
casamento ,beijos
"Dois bons perdoadores"! Muito bom isso! Essa é uma fórmula de sucesso no casamento, Mira querida. Parabéns!
ExcluirBeijos.
Ai Rosa, como você sabe das coisas...
ResponderExcluireu assino embaixo, casamento é como rapadura: é doce, mas não é mole não...
Eu e o meu marido também somos bem parceiros, um faz tudo pelo outro e nenhum dos dois se sente diminuído, se um de nós chega mais cedo e tem louça para lavar, vai par a pia sem problemas, nunca tivemos problemas com divisão de tarefas.
Bjs
Rapadura - essa eu nunca tinha ouvido. Totalmente certo. Esse é o tipo de coisa que os pais deviam ensinar aos filhos, da mesma forma como ensinam a andar, falar, comer sozinhos. Ensinar que, na vida, nem tudo que é doce é fácil de aproveitar: tem que achar a forma certa de usufruir do que quer que seja. Beijos e parabéns pelo casamento especial. O meu às vezes lava a louça também - fica lindinho de avental de cozinha...
ExcluirBeijos!
Olá, eu adoro ler as suas histórias, você é uma sábia!
ResponderExcluirQuanto a blusa preta que eu fiz , não é lã cristal, é o fio industrial LanSul, nesta blusa usei dois fios.
Um abraço, Gladis!
É linda a blusa, torno a dizer, tem um brilho essa lã... Preciso saber onde compra.
ExcluirBeijos e obrigada pelo retorno.