sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Um olhar pro mundo...

A forma como vemos o mundo à nossa volta
pode fazer toda a diferença...

Vejam só como são as coisas: filhos adultos, que já sabem andar por tudo o que é canto sem mim - e mesmo assim pedem "Mamãe, você vai com a gente no DETRAN, não vai? Por favor, velhinha, vem com a gente..."


E aí eu faço o quê? Lógico que eu vou - mãe é prá quê, né? Acordo mais cedo, deixo o almoço pronto pro moleque e pro colega de quarto, tomo meu banhinho, coloco um tênis no pé - antecipando muita bateção de perna - e vou com as duas "meninas" pro metrô, espiar de pertinho o mundo.

É sempre uma aventura sair de casa - nem sempre agradável, diga-se de passagem. De madrugada, por exemplo, quando levo a Naninha pro metrô Penha às cinco e quinze da madrugada (prá ela ir no seu longo caminho até a faculdade) é muita informação ao meu dispor, mesmo com tão pouca gente acordada... 

São os mendigos que dormem nos cantos já conhecidos do meu trajeto, os cachorrinhos sem dono perambulando assustados, os carros que passam correndo pelo farol vermelho, os velhinhos que dormem nos postos de gasolina à noite, em sub-empregos - deixando suas esposas sozinhas em casa, complementando o irrisório benefício da Previdência Social com o bico de vigias... 

Anoto mentalmente cada lâmpada apagada, cada buraco no asfalto - e mais tarde mando email prá Prefeitura, pois eles precisam dos nossos olhos prá consertar o que precisa ser consertado, não é mesmo?

Faço uma breve prece pelas pessoas que acordam tão cedo prá trabalhar, andando apressadas na noite ainda tão escura, receosas de serem assaltadas - pois tem gente que não acorda cedo prá trabalhar, mas passam as noites em claro maquinando formas de se apropriarem dos frutos do suor alheio - nunca vou entender isso...

Ontem minhas filhas precisavam de mim - e quando não precisam? Sabe, um tempo atrás a Nana me disse que, sempre que eu fico internada, parece que a casa fica menos segura... "Mãe, quando você não está em casa parece que um ladrão vai conseguir entrar e assaltar a gente...". E olha que eu não conseguiria nem mesmo dar um tapa nele - mas ainda não desisti da minha estapafúrdia ideia de comprar um soco inglês prá me prevenir - velha violenta, essa sou eu (o mundo, às vezes, desperta nosso pior, infelizmente...). O patrão ri da minha cara e diz que mesmo com soco inglês eu não ia conseguir fazer nada - como a passagem do tempo nos faz frágeis!

Então as meninas decidiram tirar carta de motorista juntas, aproveitando as férias da Naninha da faculdade - e mesmo sabendo se virar muito bem, cada uma por sua vez veio pedir prá eu ir junto...

Quando chegamos no metrô fomos checar os créditos no bilhete único - e eles tinham que ser recarregados, só tinha trocados. Uma fila enorme nos esperava - mas saímos bem mais cedo, prá poder andar com calma, ir a todo canto sem pressa nem stress. Enquanto aguardávamos a nossa vez, atrás de nós na fila uma mãe e seu filhinho de uns nove anos de idade tinham uma conversa particular - perfeitamente audível aos meus ouvidos:

"Vou colocar só metade do dinheiro, senão não vai dar prá você comer nada, filho. Eu não quero que você passe mal de fome..."

"Mas, mãe - se colocar só metade não vai dar prá gente ir em todo canto que a gente tem que ir e ainda voltar! Vai sobrar dois reais, dá uma coxinha prá mim e uma prá senhora..."

"Só uma coxinha é pouco, filho. Você vai passar mal quinem da outra vez... Vou colocar só R$12,50 e o resto a gente usa prá comer alguma coisa."

Tão doce o jeito como conversavam um com o outro! O menino parecia tão bonzinho, tão educado... 

Sem querer eu devo ter olhado prá eles, pois a mulher abaixou os olhos, envergonhada - e se calou. Eu dei um sorriso amistoso, ela devolveu, mas a vergonha ainda estava lá... Deve ter imaginado que eu era uma pessoa rica, por ser mais alta, estar vestindo uma linda blusa de crochê - e eu quis dizer a ela, do fundo do coração, que eu também já tive meus tempos de contar moedas muitas e muitas vezes prá comprar uma coxinha... Quis dizer prá ter fé, que tudo ia melhorar - mas acho que ela, no fundo, já sabia disso...

Dentro do trem lotado eu me equilibrei de pé, junto das meninas, escutando a conversa animada delas duas, seus risos - se dão tão bem! Completam frases um a da outra, riem de coisas que só elas entendem - e eu rio junto, só pelo prazer da companhia. Na minha frente, um rapaz sentado no banco de idosos, ouve em tom absurdamente alto uma música bem barulhenta - barulho escapando dos fones de ouvido similares a donuts alojados em sua cabeça. Chamei minhas filhas e disse, em tom de brincadeira, que iria dançar ali, na frente de todos, a música que ele estava ouvindo... Das duas, uma: ou ele ia ficar chocado por uma velha apreciar aquele tipo de música e ia passar a odiá-la (a música...) ou ia finalmente perceber que não deveria obrigar o resto do mundo a ouvir junto com ele o seu peculiar gosto musical...

A Lola ri e me pergunta como é que as pessoas viajavam de metrô no meu tempo, "antigamente", quando não existiam celulares prá se distraírem... "Devia ser horrível, mamãe, ficarem olhando uns prás caras dos outros ou prás mesmas janelas de sempre!" - e eu disse que eu não fico grudada no celular mesmo hoje, nos tempos de "hojemente"... Prefiro olhar as mesmas janelas de sempre e os rostos que quase nunca se repetem...

No DETRAN, enquanto elas aguardavam na fila, fui me sentar em frente aos guichês, com meu crochezinho na mão. Quando elas voltaram com a senha prá fazer biometria eu falei, brincando: "Tá vendo só esse povo todo, meninas? Aposto que eles olham prá mim e imaginam que eu estou aqui prá renovar minha habilitação, que eu sou uma mulher independente e motorizada. Chique, né?" - e dou prá elas uma piscadinha (o que basta prá me encherem de beijos, escandalosamente em público, dizendo que eu sou linda e só não dirijo porque não quero...).

Simplesmente não nasci prá isso - é tão complicado! A única vez que tentei aprender quase atropelei um garoto andando de bicicleta e nunca mais! Embaralha minha cabeça imaginar ter que ficar pisando ora num pedal, hora noutro, trocar as marchas, engatar a ré, piscar a luz da direita ou da esquerda - muito complicado! Na próxima vida, quando os carros forem movidos a poder do pensamento, vou ser piloto de corrida, pois minha cabeça funciona bem que é uma beleza - mas nesta, vou de passageira. Se alguém não puder me levar de carro prá onde eu tenho que ir, vou de ônibus, de trem, de metrô, tanto faz - mas vou prestando atenção na vida à minha volta...

Comemos no shopping, experimentei café do Starbucks (o meu é, de longe, mil vezes melhor...), xeretamos vitrines - dia de meninas. 

Fomos até a Clínica fazer o exame psicotécnico e lá uma "pessoa famosa" furou nossa vez no atendimento. Nunca a vi na vida, mas seu Relações Públicas, enquanto ela era atendida, nos falou que no outro local onde eles tinham ido estava cheio de paparazzi atrás dela - e ficou mostrando prá todo mundo fotos dela no celular dele com outras e mais outras pessoas famosas. Entre uma coisa e outra a tal moça, de óculos escuros, ficava no celular se queixando de como era triste ser famosa, não ter direito de resolver seus assuntos sem montes de gente atrapalhando e xeretando, que só porque ela era famosa não significava que ela era "assim tão melhor que as pessoas comuns" e blá, blá, blá... Muito barulho por nada - se alguém quer saber o que eu penso a respeito.

Fomos na auto-escola marcar as aulas, na loja de armarinhos comprar lãs prá Nana fazer presentes pros amigos...

Quase no final do dia chegamos em casa - cansadas, cumpridoras de tudo o que nos propusemos a fazer naquele dia (com a pia cheia de louça do almoço dos homens da família prá eu lavar - cadê a marreta prá eu quebrar tudo???). 

Na memória, um montão de pessoas que eu nunca mais vou ver de novo, que desfilaram na minha frente e chamaram minha atenção, que me contaram curtas histórias de suas vidas por suas palavras, pelo jeito de andar, pela cor de seu batom, da sua blusa... Olhos tristes, olhos sonhadores, passos apressados nos caminhos apressados por onde andei, devagarinho nos meus próprios passos, observando o mundo através das janelas da minha alma... Se eu dirigisse carro teria perdido tudo isso, perdida entre tantos pedais e cacarecos...

E, no final, não entendi por que minhas filhas me quiseram junto - resolveram tudo sozinhas! 

"É que quando você tá junto da gente, mãe, a gente se sente mais segura, mesmo que você não faça nada...".

Essa sou eu - nunca, nem que eu queira, vou ficar obsoleta (graças a Deus!). Pelo menos essa é a forma como eu vejo - mas desconfio que seja a mais pura verdade...

Como Jesus dizia: "Seja-vos feito segundo a vossa fé" - que assim seja, graças a Deus!

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20 comentários:

  1. Rosa, só você consegue me fazer chorar em quase todos seus posts…
    Que coisa mais linda o seu olhar para o mundo, que Deus abençoe as janelas de sua alma.
    E que bênção de filhas você tem….nunca vi tanto amor! Normalmente os jovens querem fazer tudo sozinhos e acham que a gente não sabe nada…
    Bjs querida e um lindo final de semana para você e essa família maravilhosa que você tem

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    1. Obrigada, Doutora querida, espero que você tenha uma semana maravilhosa!

      Minhas meninas - aliás, meus filhos - se dão super bem uns com os outros e sempre me querem por perto (costumo pensar que ganhei na loteria três vezes...). Eles é que me dão força, mesmo quando eu tô cansada ou doente eu sempre arrumo um jeito de estar presente e de fazer meu melhor por eles. São minha vitamina...

      Beijos!

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  2. Com a mãe junto dá mais auto confiança , e é bom estar junto também , mesmo que ache não não precisasse.
    bjs

    http://eueminhasplantinhas.blogspot.com.br/

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    1. Eu também acho, adoro estar junto, poder ser útil de alguma forma às pessoas que mais amo no mundo...

      Beijos e uma linda semana, Simone querida!

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  3. Minha querida Rosa, o amor brota de seus poros, o seu olhar amoroso sempre nos convida a ver a vida de outra forma. Como é bom poder ler suas mensagens de vida! Como é bom saber que temos valor e somos importantes na vida de alguém. E assim é entre você e seus filhos, todos são importantes uns para os outros. Que o Senhor a abençoe. Beijinhos.

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    1. Obrigada, Ligia querida, que Deus te abençoe também! Sei que com você também é assim, você também é presença constante na vida da filha e dos netos - você também nunca vai ficar obsoleta, minha amiga!

      Beijos e uma linda semana!

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  4. Rosa

    Eu também fui assim com minha mãe, me sentia mais segura se ela estivesse por perto. Hoje, percebo que a maioria dos jovens não querem a companhia da mãe ou do pai nas decisões da vida deles.
    É uma pena, por um lado e do outro lado não quanto a se tornarem auto-suficientes.
    Posso estar enganada mas parece-me que suas filhas foram criadas à moda antiga, com todo respeito e sinceridade, elas não parecem ser dessa atualidade juvenil.

    Torço para que elas, quando forem mães, eduquem os filhos desse modo para que não morra essa educação que coloca os pais acima dos amigos.

    Bjs

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    1. Sabe, eu li um dia um troço mais ou menos assim: os filhos, na adolescência, brigam muito com os pais prá se firmarem como indivíduos adultos, é chamado "divórcio dos pais". Coisa besta, não é mesmo - mas até faz um certo sentido, se a gente não ligar prá esse absurdo de "divórcio"... Ainda hoje eu fico meio com medo de acontecer comigo, me perguntando: "Será que um dia desses eles vão começar a me dar trabalho?", mas eles são sempre tão doces comigo - acho que vamos ficar "casados" prá sempre...

      Acho que cada ser humano encontra seu próprio caminho do seu jeito e o fato de entrarem em atrito de vez em quando não significa que não haja amor - só significa que não sabem lidar com as diferenças de outra maneira.

      O importante é termos paciência uns com os outros, que tudo acaba se ajeitando, não é mesmo, Fatinha querida?

      Beijos e uma ótima semana prá você!

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  5. Rosa, me fez lembrar de quando eu também ia com as minhas prá todo lugar. Senti saudades... mas as duas agora estão casadas e ainda saímos juntas, mas com menos frequência!
    Adoro esse seu jeito de olhar o mundo! E com suas palavras você consegue nos passar os detalhes com perfeição!
    beijo

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    1. É assim mesmo, Luci querida - esse tempo chega prá todas nós, mães...Já planejei fazer lasanhas, risoles, montes de comidinhas boas prá ter desculpa de aparecer sempre na vida deles - aposto que você faz isso, não é?

      Beijos, minha querida - e uma linda semana!

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  6. Você contando seus devaneios e eu tendo os meus... já pensou se todas as mães e filhos do mundo fossem como sua família? Como seria este mundo? Muito melhor. O que falta no mundo é amor.
    E, é claro, suas histórias são hilárias...kkkk
    Bjs

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    1. Eu também acho que o que falta no mundo é amor - amor de verdade, que ouve, que conversa, que está presente quando se precisa de um ombro, que sabe dar uma bronca com razão e sem violência. A maioria dos pais acha que dar tudo de material é dar amor, mas não contam uma história na hora de dormir, não perguntam ao filho se está tudo bem, não prestam atenção nos detalhes - isso faz uma diferença danada na vida da pessoa.

      Beijos, minha querida e tenha uma excelente semana!

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  7. Olá Rosa!
    Faço parte de um destes rostos que nunca se repetem e fiquei emocionada com seu texto, este seu jeito carinhoso com a vida, com os filhos, com os estranhos me cativou.
    Quem é bom e sabe amar e conseguiu ensinar isto aos seus jamais fica obsoleto.
    Não gostaria de fazer parte do montão de pessoas que você nunca mais verá novamente. Se me permitir volto sempre.
    Um ótimo fim de semana.

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    1. Ah, minha querida Judy! É claro que você vai ser sempre bem vinda, é tão prazeroso saber que você gosta de me visitar!

      Beijos e tenha uma linda semana!

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  8. Dona Rosa, boa tarde!
    Eu recebo seus textos por RSS e assim, os leio em minha caixa postal, e assim sendo, nunca comento.
    Mas preciso vir aqui de vez em quando só prá dizer o quanto gosto das suas crônicas. Elas me levam à um mundo paralelo, cheio de leveza, onde a realidade e a simplicidade ainda são fatores tão importantes e nemnos damos conta!
    Adoraria ter tido uma mãe como a senhora, e vou fazer o possível para ser uma mãe como a senhora: amiga, presente, participativa, carinhosa, fã dos filhos, e sobretudo com um coração grandioso.
    ão, a senhora jamais será obsoleta, pq amor é sentimento que se multiplica, e ainda terá muitos bons frutos a colher.
    Obrigada por partilhar conosco a sua visão do mundo que a cerca. Eu adoro seus escritos.
    Um abraço afetuoso
    Rosangela

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    1. Rosangela querida: só o fato de você desejar ser uma mãe assim já mostra que você é! A maternidade consciente é uma bênção neste mundo - tornamos o mundo um lugar melhor ao criarmos os filhos que Deus nos entrega de presente fazendo-os felizes, com um amor sempre presente. Você faz isso, não é mesmo?

      Obrigada por tanta gentileza para comigo, minha querida!

      Beijos e tenha uma ótima semana!

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  9. Mais uma bela crónica...cheia de VIDA e vivências!
    Bj amigo!

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    1. Obrigada, Maria da Graça!

      Tenha uma linda semana, minha querida. Beijos!

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  10. Adoro seus textos Rosa! Vc escreve com tanta singeleza que a gente sente o amor transbordando a cada linha lida! Que Deus continue te abençoando com este dom e que abençoe essa sua familia linda também! É tão gostoso ver um amor assim na família, coisa tão rara hoje em dia! Mas com pessoas como você habitando este mundo, ainda há esperanças! Beijos no coração!

    Eliane (Leituras de Eliane)
    (Mundo da Casa)

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    1. Muito obrigada, Eliane querida, tem muita bondade no teu coração prá encontrar nele essas palavras prá mim... Fico feliz que você goste dos meus textos, me faz querer escrever melhor...

      Beijos e tenha uma linda semana!

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