Uma fábula oriental descreve um ajuntamento de ociosos num pequeno mercado, nos arredores de Jerusalém, em torno de um cão morto que ainda trazia, amarrada ao pescoço, a corda com que o haviam arrastado pelo chão. Todos os que o cercavam, olhavam-no com repugnância...
- Empesta o ar - disse um, apertando o nariz com os dedos e fazendo uma careta de náusea.
- Reparem na sua pele rasgada: nem para fazer correias de sandálias seu couro serve - zombava outro.
Um egípcio corpulento aludiu às orelhas sujas e sangrentas do animal e rematou, com a voz empastada:
- Sem dúvida, foi enforcado por ser ladrão.
Desse grupo de homens aproximou-se um desconhecido que ouvira os diversos comentários. Em seu rosto resplandecia estranha luz e todo seu porte indicava dignidade fora do comum. Pondo seus olhos meigos no animal morto e vilipendiado, disse em seu belo e límpido idioma arameu:
- As pérolas desmerecem diante da alvura de seus dentes.
Todos que ali estavam, em torno do animalzinho, voltaram-se para o desconhecido com assombro e, vendo-o tão sereno e compadecido, indagavam, entre dentes, quem poderia ser aquele homem. E retiraram-se, de cabeça baixa, envergonhados, quando alguém arriscou um palpite: "Deve ser Jesus, o mestre de Nazaré, pois só ele sabe encontrar qualquer coisa digna de piedade e aprovação, até mesmo num cachorro morto."
Página retirada do livro "Lendas do Céu e da Terra", do escritor brasileiro que escrevia sob o pseudônimo de "Malba Tahan"...
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